Poucos meses atrás, a Corneliani, uma fabricante de ternos elegantes que chegam a custar US$ 2 mil, percebeu que estava perdendo negócios na Índia. E aí percebeu o motivo: não estava atendendo clientes acima do peso. Então, em abril ela começou um serviço sob medida que inclui a possibilidade de os clientes comprarem ternos, casacos e calças em tamanhos “fora do padrão”, explica Prem Dewan, que supervisiona as operações varejistas da companhia na Índia.
Desde então, empresários, celebridades e políticos começaram a telefonar. “O problema não é a barriga dos indianos e foi por isso que começamos este serviço sob medida”, explica Dewan. “Estávamos perdendo clientes por causa disso e depois que começamos o serviço, estamos respondendo a esses clientes.”
Mesmo com 400 milhões de indianos – um terço da população – vivendo na miséria, um boom econômico de uma década criou uma classe média mais próspera e alimentou o aumento da obesidade, das doenças do coração e do diabetes nas grandes cidades. Com isso, as marcas de roupas passaram a atender aqueles necessitados de ternos maiores feitos sob encomenda e vestidos “plus-size”.
O mercado de roupas de marca da Índia deverá mais que dobrar de tamanho até 2017, para US$ 18 bilhões, segundo a consultoria Technopak Advisors, o que está encorajando marcas como Ermenegildo Zegna e Corneliani a ampliarem seus negócios.
Depois que o crescimento econômico do país caiu para 5% no último ano fiscal, o menor número em uma década, mais grupos varejistas começaram a se voltar para os mercados especializados, como os de produtos fora dos padrões considerados padrão, diz Abhay Gupta, diretor-presidente da Luxury Connec t, uma consultoria de Nova Deli especializada em mercado varejista.
A Organização Mundial do Comércio (OMC) prevê que cerca de 31% dos homens adultos da Índia estarão acima do peso em 2015, em comparação a 22% em 2005. Mesmo assim, isso não é pouco se comparado a países como os Estados Unidos, onde 69% dos adultos com mais de 20 anos estavam acima do peso em 2008, ou o Reino Unido, em que a proporção era de 62%, segundo a OMC.
Especialistas afirmam que o aumento dos casos de obesidade e diabetes na Índia pode ter suas raízes na história de falta de alimentos, que data de séculos. A pobreza e a fome aparelharam o organismo dos indianos, ao longo de gerações, a sobreviver com menos, favorecendo indivíduos com genes que os tornam mais eficientes no acúmulo de gordura. Na última década, quando o crescimento econômico foi em média de quase 8% ao ano, as dietas ficaram mais gordurosas e dezenas de milhões de pessoas adotaram estilos de vida mais sedentários.
Isso levou a um aumento da obesidade em uma população mais predisposta geneticamente a ganhar peso do que no Ocidente, explica Nikhil Tandon, professor de endocrinologia e metabolismo do All India Institute of Medical Sciences em Nova Deli. “A quantidade de gordura está inevitavelmente maior nos indianos” do que nos ocidentais com o mesmo tamanho corporal, diz Tandon.
Os indianos também estão comendo mais carne na medida em que ficam mais ricos, e desenvolvendo um gosto por “fast food”, com o crescimento de redes internacionais como Domino’s Pizza, KFC e McDonald’s no país. “Quando esses genes começam a receber os estímulos ambientais errados, as coisas começam a se desencadear”, diz Tandon.
A varejista de roupas online Myntra.com está respondendo a isso encomendando mais roupas de tamanhos grandes para atender a demanda, afirma Ganesh Subramanian, seu diretor operacional. “Especialmente nos vestidos para mulheres há uma propensão aos tamanhos grande e extra-grande”, acrescenta Subramanian.
Cerca de 20% das roupas masculinas e femininas feitas pela varejista Zovi.com são XL (do inglês “extra large”)e XXL (“extra-extra large”), em comparação a 15% há seis meses, diz o diretor-presidente Manish Chopra. “Acho que havia uma demanda latente e não estávamos dando atenção a ela”, afirma.
Para os comerciantes, a questão não não é apenas tornar as roupas maiores. Os sul-asiáticos têm uma propensão maior a armazenar gordura em torno dos quadris, segundo aponta um estudo publicado no “International Journal of Obesity” em 2011.
Isso significa que os indianos obesos tendem a ter uma cintura “desproporcionalmente grande”, que torna a produção sob encomenda essencial, diz Shivank Aggarwal, diretor de marketing da Shiva International Apparels, que opera uma rede que vende roupas tamanho plus-size.
“Os indianos têm uma estrutura física diferente e portanto precisamos desenhar o produto de uma maneira diferente”, acrescenta Aggarwal.
Embora os negócios “sob medida” estejam prosperando, nem todos são voltados para os gordinhos. Os indianos também estão exigindo cortes mais elegantes na medida em que ficam mais ricos e viajam pelo mundo.
Os ternos feitos sob medida refletem a crescente sofisticação dessas pessoas e um desejo de se destacar, diz uma porta-voz das operações indianas da Ermenegildo Zegna.
As pessoas acima do peso constituem uma parcela “pequena” dos negócios feitos sob medida da companhia no subcontinente asiático, segundo ela. Marcas de luxo concorrentes como Canali e Giorgio Armani também oferecem ternos sob medida em suas lojas indianas e a Gucci iniciou seu serviço em novembro.
A Corneliani diz que os artigos sob medida já contribuem com 15% de suas vendas e que a demanda deverá aumentar durante a temporada de casamentos do quarto trimestre. Em última instância, a ideia não é personalizar tamanhos, cores e tecidos para os consumidores indianos mais ricos – magros ou acima do peso. “A economia não está indo muito bem, mas isso não importa muito para os clientes ricos”, diz Dewan. (Tradução de Mario Zamarian)
Fonte: Site Valor Econômico
Link: https://www.valor.com.br/empresas/3197718/indianos-gordos-mudam-o-varejo-de-roupa#ixzz2Z7lqIaRy