Com o real fraco e várias empresas brasileiras em dificuldades, fundos soberanos ou de famílias reais prospectam negócios em setores como mercado imobiliário, agronegócio e logística; Frigorífico Minerva e terminal da CSN estariam entre os alvos
Conhecidos pela fama de cautelosos por seus pares, fundos árabes de investimentos se lançaram, nos últimos meses, em uma ofensiva para avaliar negócios no Brasil. Com a desvalorização do real frente ao dólar e o maior número de ativos mais baratos no País, reflexo direto da crise econômica, esses fundos se encorajaram a prospectar aquisições por aqui, sobretudo, em empresas ligadas a agronegócios, mercado imobiliário e logística.
Segundo fontes, um dos alvos da investida árabe não é o Frigorífico Minerva. Segundo maior exportador de carne bovina do País, o frigorífico despertou o interesse da Saudi Agricultural and Livestock Investment (Salic), gestora fundada pelo rei da Arábia Saudita para investir especificamente em agricultura. A empresa saudita busca negócios no País na tentativa de garantir a segurança alimentar a uma região marcada pelas dificuldades na produção agrícola, em função da escassez de água.
Procurado, o Minerva não comenta o assunto, mas fontes afirmam que o frigorífico, que está altamente endividado, busca sócios e negocia a entrada de um investidor.
Menos agressivos que os tradicionais fundos de private equity (que compram participação em empresas para vender depois com lucro), boa parte desses fundos árabes – soberanos (do governo) ou de famílias reais – costuma agir como co-investidor, tem um tíquete alto para compra (que pode variar de US$ 200 milhões a US$ 500 milhões) e pensam a longo prazo.
Tradicionalmente, costumam se aliar a outros fundos globais ou locais para aportes em projetos prontos, sem grandes riscos. É o caso do fundo soberano do Catar, o Qatar Investment Authority (QIA), que investiu na Abril Educação (hoje Somos Educação), com o fundo Tarpon, um dos acionistas da empresa de alimentos BRF.
Em busca de negócios mais resilientes e com valorização no futuro, o fundo soberano dos Emirados Árabes Unidos, o Abu Dabi Investment Authority (Adia) tem prospectado ativos no mercado imobiliário. No mês passado, o Adia anunciou associação com a Iron House, do grupo pernambucano Cornélio Brennand, para construir o primeiro hotel da rede canadense Four Seasons.
“O fundo tem investimentos em empresas brasileiras e uma equipe interna de gestores com foco na América Latina. O Brasil tem uma parte considerável dessa carteira”, garante uma fonte próxima ao Adia. Outras fontes afirmam que o fundo está à procura de imóveis sobretudo no eixo São Paulo-Rio.
Nem um histórico conturbado no País fez outro fundo soberano, o Mubadala, também de Abu Dabi, perder o apetite pelo Brasil. Um dos maiores investidores do império X, o fundo chegou a fazer um aporte de US$ 2 bilhões no grupo. Depois da derrocada das empresas criadas por Eike Batista, o Mubadala decidiu reverter o jogo.
O fundo converteu sua dívida em participação nos negócios de Eike e passou a deter ativos como a mineradora de ouro AUX, a empresa de entretenimento IMX, dona da marca Rock in Rio, e participação na Prumo Logística (antiga LLX). Em parceria com a trading Trafigura, o Mubadala tem hoje 65% do Porto do Açu.
Agora, o interesse do fundo soberano teria se voltado para o terminal de contêineres Tecon Sepetiba, que pertence à Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), do empresário brasileiro Benjamin Steinbruch. Avaliado em cerca de R$ 1 bilhão, o Tecon tem vários interessados e a transação poderá ser definida ainda este ano. A CSN e o Mubadala não comentam.
Cartilha. As tomadas de decisões não costumam ser rápidas. Antes de fechar um negócio, eles seguem uma cartilha da lei islâmica – conhecida como Sharia. Por esse conceito, seus investimentos não podem, por exemplo, estar atrelados a empresas que fornecem bens ou serviços considerados contrários aos princípios islâmicos. “Há limites e regras claras. Por isso, esses investidores buscam negócios legados ao agronegócio, sustentabilidade, logística”, afirmou Aldo De Cresci, sócio do Gasparini, De Cresci e Nogueira de Lima Advogados. “Atividade financeira que gera lucro por mecanismos puramente de natureza especulativa não é vetada.”
Fonte: Estadão